Instituto Amélie

Amar é Revolucionário

Por Ana Luiza Braga

Tempos modernos e contextualizados em uma cultura ocidentalizada, tem como característica a ênfase em uma busca pelo bem estar individual absoluto. Qualquer possibilidade de desconforto causa estranhamento e, por consequência, padrões que visam eliminá-lo imediatamente. O problema é que todo esse cenário, na qual estamos cada vez mais avesso aos sentimentos considerados como “aversivos”, tem trazido um efeito muito danoso para nossa qualidade de vida. Me explico…

Quanto mais buscamos a nossa felicidade pessoal (literalmente de forma autocentrada), mais corremos o risco de nos afastarmos de convites que zelam pelas trocas interpessoais. Estar em convivência íntima, dentre inúmeros benefícios, também se configura em estar exposto à alguns desconfortos que ferem esse ideal de felicidade absoluta. Afinal, as diferenças inerentes a própria subjetividade aumentam possibilidades de frustrações relacionais. Mas, aqui já temos um irônico paradoxo: buscamos o prazer e felicidade a todo custo, focamos nos nossos anseios e nos protegemos de possíveis frustrações. Mas, exatamente por toda essa proteção hiperdimensionada e que nos “afastam” de focos de frustrações é que observamos o fenômeno de pouco investimentos em relações íntimas e profundas. Logo, nos jogamos em um porfundo abismo de solidão- sentimento esse considerado um dos mais perigosos para a nossa saúde mental e, inclusive, física. Percebem onde mora a armadilha?

Portanto, fica fácil pressupor o quanto todo esse processo prejudica dois principais e básicos pontos inerentes à condição qualidade de vida:

1) Relações sociais profundas, seguras e interconectadas.
2) Habilidades de sentir, refletir, ressignificar emoções.

Bauman em seu livro “Amores Líquidos” analisa esse fenômeno de pouca tolerância ao desconforto nas ociedades atuais. E, em suas observações, conclui que as relações estão cada vez mais descartáveis quanto expostas ao menor sinal de descontentamento/frustração.

Verdade ou não tal ponto de vista, o fato é que estamos vivendo tempos de pessoas cada vez mais isoladas (com vínculos abstratos e meios não humanos de conexao- redes sociais) e cada vez mais adoecidas. As taxas de depressão e transtornos de ansiedade só aumentam a cada dia e em todo o mundo.

Toda essa discussão me deixa bastante reflexiva. Afinal, todo meu movimento profissional e de vida vai na contra mão dessa atmosfera superficial. Não me caibo em absolutamente nada que não se configura “de verdade”. Em todo meu processo de busca sobre meu propósito de vida- jornada essa muito complexa, intensa, desconfortável e libertadora- me vi tomando consciência sobre a importância de presença em vida. Não é processo fácil esse de se apropriar do que é seu e, a partir dessa reintegração, ir em busca de caminhos valorosos. Mas, é necessário! E em todo essa busca de respostas, encontrei (talvez a palavra certa seja “reascendi”) uma certeza que tanto tentei silenciar em mim: o poder do amor. Amor em tudo que acredito, por tudo que faço. Amor de estar em vida e de poder senti-la através de tantas portas e dimensões. Mas, acima de tudo, o amor pelas pessoas que a mim são tão importantes.

Talvez, ir na contra mão de toda essa imposição inatingível de plenitude e prazer pareça inadequado ou “démodé”, para alguns mais críticos e que ainda não entenderam a essência intrínseca de ser humano.

Mas, gosto de pensar que é um ato de coragem. Um movimento revolucionário que rompe toda a violência adoecedora de suprimir algumas das nossas necessidades mais básicas e inerrentes à vida: conexão, pertencimento e proteção. Gosto desse protesto contra a desumanização de nossa essência. Atitude ousada de busca de sentido e dar sentido à uma jornada de vida.

Ser social não se caracteriza por funcionalidade, mas por capacidade de amar. E amar é só uma pequena junção de letrinhas que significa: tudo que mais importa, que mais nos suporta e que nos move além. Amar é conectar e não há outro jeito de viver o convite da vida.

Se amar é revolução e protesto a todo esse mau hábito de estarmos cada vez mais só, então só existe aqui uma convite possível:

Façamos revolução!
Aliás, façamos transgressão!